Certa vez, num lugar bem distante, onde ainda não havia selvas de pedra
como a que vivemos hoje, havia um rapaz que vivia sozinho e triste. Sua
tristeza tinha um motivo: ele não tinha o que comer nem o que beber e morava
sozinho. As últimas colheitas foram um desastre por causa da praga e da chuva.
Além disso, não havia água em abundância por ali. Por isso, todo mundo já tinha
saído daquela região. Assim, não tinha ninguém com quem conversar. Certo dia,
ao acordar, ele decidiu ir embora daquele lugar. Seu sonho era encontrar
um lugar bonito e cheio de fartura, que ele pudesse chamar de lar.
Saindo de lá, caminhou por horas por uma longa estrada de terra. Ao
final do dia, encontrou um descampado e decidiu parar para descansar. Ele
escolheu uma árvore, e, então, lentamente, abaixou e se deitou, tendo a grama
como lençol. Estava sem forças; a caminhada foi dura. Seus músculos estavam tão
doloridos, que, mesmo quando a fome apertou e a sede veio reclamar um pouco
d’água, preferiu o sono como alimento. Quem dorme não sente fome, sua avó
dizia.
Ao despertar da aurora, o rapaz levantou, ajuntou forças, e continuou
sua jornada.
No meio de uma estrada, ele encontrou uma mulher brava, mal-humorada,
que vinha resmungando pelo caminho. Ao se aproximar da senhora, o rapaz a
cumprimentou e perguntou se estava tudo bem. A mulher respondeu sem paciência
que não era de sua conta, que ele cuidasse da vida dele. Mas o rapaz não se
abalou e falou que era uma pessoa simples, sem propriedades nem dinheiro, mas
que estava disposto a ajudá-la no que fosse possível.
- Siga o seu caminho! A velha respondeu, completando: “E não se
incomode com uma estranha, velha, pobre e ranzinza”.
Ao contrário do que propôs a mulher, o rapaz se aproximou ainda mais e
disse:
- Minha senhora, deve ter alguma coisa que eu possa fazer, deixe eu
ajudá-la!
Ao dizer essas palavras, a velha se transformou em uma linda jovem, e
com uma voz suave e cheia de melodia falou, sorrindo:
- Meu caro rapaz, você recebeu um dom muito especial de Deus, o dom de
amar ao próximo e ajudar a quem precisa. Por ser tão especial assim, quando
estiver em apuros, basta que me chame, dizendo: Valei-me, Senhora da Amizade! E
eu virei em seu auxílio imediatamente.
O rapaz agradeceu e seguiu seu caminho, refletindo sobre o valor da
amizade e do amor ao próximo. Ele ficou feliz com a nova amizade, afinal, ter
uma amiga com poderes mágicos é sempre bom. A gente nunca sabe quando o destino
vai nos por à prova. Com esse sentimento de felicidade, e com esperança de que
nunca precisasse recorrer à Senhora da Amizade, foi caminhando e logo chegou a
um reino, que ficava ali próximo.
Nesse reino, havia uma princesa que há semanas estava muito triste. O
rei, seu pai, já havia feito de tudo para vê-la sorrir de novo, chamou até os
melhores médicos, ofereceu os melhores presentes, mas nada a tirava daquela
situação. A princesa estava profundamente triste por ter perdido a bolinha de
ouro com qual brincava sempre e que tinha sido presente de sua mãe, a rainha,
antes de morrer. Nada mais tinha graça para ela, nada mais tinha valor.
Ao chegar nesse reino, o rapaz foi tomar um pouco de água numa bica e,
conversando com alguns moradores dali, ficou sabendo que o rei havia prometido
terras e um bom montante em dinheiro para quem achasse a bolinha de ouro de sua
filha. Nesse instante, ele se lembrou do que a Senhora da Amizade havia
prometido a ele e percebeu que juntos eles poderiam ajudar o rei a resgatar a
alegria de sua filha. Lógico que, não sendo bobo nem nada, também ponderou que,
caso conseguisse resolver o problema, nunca mais teria que andar pelo mundo sem
destino, nunca mais passaria fome, nem sede. Mas o que mais o motivou foi
pensar que estaria ajudando a princesa a acabar com aquela tristeza sem fim.
O rapaz procurou um lugar discreto e fez uma tentativa de conversar com
a Senhora da Amizade, dizendo:
- Valei-me, Senhora da Amizade!
Para sua surpresa e alegria, a sua amiga apareceu imediatamente em sua
frente e perguntou:
- O que foi meu jovem? Como posso lhe ajudar?
O rapaz explicou o que estava acontecendo com a filha do rei e disse
que queria ajudá-la a encontrar a sua bolinha de ouro. Ele não precisou dizer
mais nada, pois a fada já havia entendido o que ele precisava. Então, ela
convocou os pássaros e os animais, pedindo que todos procurassem a bolinha de
ouro da princesa. E não demorou para que um guaxinim cinza, com manchas pretas
ao redor dos olhos e um rabo todo listrado, bem fofo e esperto, aparecesse correndo,
respirando com sofreguidão. Ao chegar aos pés da fada, ele estendeu as duas
mãozinhas com a bolinha de ouro que trazia, com cuidado. O rapaz, com grande
entusiasmo, agradeceu ao lindo animal, que ficou todo feliz por ser o único a
encontrar a bolinha. E corou de vaidoso quando a Senhora da Amizade lhe deu um
beijo e agradeceu seu serviço. O moço agradeceu à amiga e disse que ela poderia
contar com sua ajuda quando precisasse, e ela se foi.
Para não perder tempo, nem dar sorte ao azar, rapidamente, o rapaz se
dirigiu ao castelo do rei e entregou a bolinha de ouro à princesa, que começou
a sorrir imediatamente. Ela ficou tão feliz que pulou no colo do pai e o
abraçou fortemente. Aliviado, o rei a beijou e pediu que fosse brincar. Então,
chamou o rapaz e perguntou como tinha encontrado a bolinha que sua filha
perdera, quando tanta gente já havia tentado e não havia tido êxito.
Quem tem um amigo, tem tudo! O rapaz respondeu. E o rei, que não
entendeu muito bem, mas ficou satisfeito com o resultado, deu ao jovem o que
tinha prometido: terras para morar e cultivar e muito dinheiro. Mas antes
disso, como era hora do almoço, o rei fez questão de que ele participasse do
banquete de comemoração. Você já deve estar pensando e é isso mesmo: o bom moço
se empanturrou de tanto comer e se esbaldou com taças de vinho.
Como havia passado muito tempo de dor e tristeza pela perda da bolinha
de ouro da princesa, o rei achou que era momento de comemorar e decretou que,
por três dias e três noites, todos os cidadãos do reino iriam festejar a volta
da felicidade da princesa, com muita comida, muito vinho e muita música para
todos. Assim, além de rico, o rapaz se tornou muito famoso. E sempre que alguém
perguntava como ele havia conseguido, ele dizia:
- Quem tem um amigo, tem tudo!